27 de abril de 2005

o beijo da cereja


Quisera eu ser uma cereja,
nascida do branco e do verde,
aquecida ao sol, refrescada ao vento.
Crescendo encarnada
como os teus lábios.
Virás provar-me
e eu te provarei.



20 de abril de 2005

preparo os dias da cinza

«porque tu és pó e ao pó voltarás»
BÍBLIA, Génesis, 3-19

Preparo os dias da cinza.
Os tempos sem sobressalto.
A terra árida onde apenas o vento
dispersa a inutilidade das ervas.
Aguardo o silêncio fundo
das vozes que não se ouvem.
A sobra, a escuta inútil
de uma alegria perdida.

Agradeço os dias da cinza
o tempo do coração inerte.
Nele guarda-se o fogo
que nem o desejo alcança.
Espero no pó das brasas extintas
o ressurgir de uma chama,
escondida e de novo acesa
no mais frio dos dias da cinza.



5 de abril de 2005

sob os teus pés

He Wishes for the Cloths of Heaven

Had I the heavens' embroidered cloths
Enwrought with golden and silver light
The blue and the dim and the dark cloths
Of night and light and the half-light
I would spread the cloths under your feet:
But I, being poor, have only my dreams
I have spread my dreams under your feet
Tread softly because you tread on my dreams.

W. B. Yeats


Sob os teus pés

Tivesse eu as bordadas vestes do paraíso
tecidas com a luz do ouro e da prata
o azul e o sombrio e os negros trajes
da noite e luz e da média luz
Eu espalharia essas roupas sob os teus pés:
Mas, sendo pobre, tenho apenas os meus sonhos
Tenho espalhado os meus sonhos sob os teus pés
Pisa suavemente,
porque caminhas sobre os meus sonhos.

(Tradução: doispontos)



3 de abril de 2005

o fogo anima

(pela benção do fogo que não morre)

coberto de águas
e de meses
esperando o que não terá fim
o fogo anima

João Miguel Fernandes Jorge